13 Outubro
Parecer do Departamento Jurídico da Aipesp acerca da Reforma Previdenciária

Parecer do Departamento Jurídico da Aipesp acerca da Reforma Previdenciária

 

Prezados membros da Comunidade Associativa da AIPESP,

São Paulo, 13 de fevereiro de 2020.

Estamos diante de iminentes e severas alterações legislativas no âmbito da previdência dos servidores estaduais. Tais mudanças legiferantes estão sendo discutidas no bojo do Projeto de Lei nº 80/2019 e merecem, por via de consequência, nossa detida atenção para que possamos juntos prever e antecipar os limites e efeitos de tal normativa na vida funcional de nossos associados. Com efeito, abaixo tencionamos trazer um panorama acerca desta temática (longe de pretender esgotar a discussão, no entanto), cujo objetivo é resguardar, da melhor e mais ampla maneira possível, o interesse dos integrantes do nosso corpo associativo.

Para que possamos contextualizar a questão ora em comento, necessário se faz partir de uma premissa. Há ainda hoje uma disputa interpretativa sobre a forma como a aposentadoria dos Policiais Civis do Estado de São Paulo se dá. De um lado, a Procuradoria Geral do Estado – PGE e a São Paulo Previdência – SPPREV argumentam que os servidores policiais somente poderão se aposentar quando atingidos os requisitos previstos nas instruções normativas conjuntas URCH nº. 2 e nº 3, que dão conta de uma aplicação apenas parcial da Lei Federal nº. 51/85. Neste sentido, há possibilidade da concessão de aposentadorias voluntárias para os policiais com 30 anos de contribuição geral, desde que haja 20 anos de exercício estritamente policial.

Porém, e eis o ponto fulcral do prejuízo havido aos servidores, embora a propalada lei 51/85 preveja a garantia da percepção da integralidade dos vencimentos ao policial que se aposenta - sistemática que passa a integrar o patrimônio jurídico do servidor -, a Procuradoria e a SPPREV passam a pagar os proventos de aposentadoria levando-se em conta média aritmética dos proventos dos servidores, que podem perfazer 80% dos vencimentos da base salarial havida em 1994 até o momento da concessão da aposentadoria. Em relação ao direito de paridade, aplicando-se aos servidores inativos os reajustes salariais próprios concedidos aos servidores em regular atividade, os tutores dos interesses estatais e do sistema de previdência em vigor no Estado também não o reconhecem, pois fazem uma interpretação restritiva (e equivocada) dos limites e alcance da Emenda Constitucional nº. 41/2003, especialmente após a regulação oportunizada pela Emenda Constitucional 47/2005.

Neste sentido, em face de tais interpretações que não traduzem o melhor Direito, necessário se faz a busca de tutela jurisdicional pelo manejo de ação mandamental (ou através do rito comum, quando aplicável) buscando a aplicação correta e ampla da Lei Federal 51/85. Com a regular sentença, garante-se ao servidor interessado o pagamento de seus proventos de aposentadoria em sua base integral e com paridade, especialmente se este ingressou no serviço público antes de 2003, tudo nos termos da decisão informativa obtida no bojo do 'Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas' - IRDR nº 0007951-21.2018.8.26.0000, que tramitou no âmbito do Tribunal de Justiça Bandeirante.

A questão que versa acerca da interpretação da lógica previdenciária paulista, no entanto, como bem sabemos, não se encerra por aí. Com o atual projeto de reforma em âmbito estadual (supramencionado PL 80/19) tramitando na Casa do Povo Paulista, os requisitos para se conseguir a aposentadoria serão alterados substancialmente.

Se prevalecer a redação sugerida pelo Governo, através dos formuladores desta política e de seus apoiadores, no novo texto legal o Policial Civil se aposentará com 55 anos de idade, partindo-se da premissa que deve obter 30 anos de contribuição ao sistema, sendo 25 anos de exercício estritamente policial e 5 anos em seu último cargo. Veja, já aqui temos relevantes diferenças ao atual sistema em vigor. Por primeiro, temos o retorno da exigência de base etária. A Lei Federal 51/85 não exige idade mínima para a aposentadoria, o que não ocorre no bojo do PL 80/19, que estipula 55 anos.

Outro ponto que nos salta aos olhos é o acréscimo de 5 anos no tempo de exercício estritamente policial, que no texto federal da lei 51/85 era de apenas 20 anos.

E aqui já temos também outra grande diferença, qual seja, não haverá - mantida a atual redação do projeto sugerido - tratamento distinto para gêneros, o que era expresso no âmbito da Lei Complementar 144/14, ainda em vigência. No tratamento atual temos que as policiais femininas precisam reunir um tempo menor para a aposentadoria voluntária (25 anos de contribuição, sendo 15 de serviço estritamente policial). Com a reforma, essa redução é afastada e a baliza temporal será igual para ambos os gêneros.

Outra importante mudança, segundo pensamos, diz respeito ao valor dos proventos de aposentadoria. Assim é que, atualmente, a Fazenda Paulista parte da premissa do patamar de 80% da média salarial contados de 1994 (para aqueles que não buscam a solução oferecida pelo Poder Judiciário, como acima explicitamos, em razão da divergência interpretativa que havia entre Fazenda e jurisdicionado). Já com o novo regramento, o Governo pretende pagar 60% da média supramencionada, sendo certo que os reajustes anuais serão atrelados àqueles praticados no âmbito do Regime Geral da Previdência Social.

Por fim, as regras de transição, a nosso sentir, não diminuem o impacto negativo da nova legislação, sendo severas. Ela possibilita aos policiais que tenham ingressado na carreira até a data da promulgação da novel normativa, as seguintes condições:

  1. 55 anos de idade para ambos os gêneros;
  2. 25 (vinte e cinco) anos de contribuição, se mulher, e 30 (trinta) anos de contribuição, se homem;
  3. 15 (quinze) anos de exercício em cargo de natureza estritamente policial, se mulher, e 20 (vinte) anos, se homem;
  4. 5 (cinco) anos no cargo efetivo em que for concedida a aposentadoria.

Já os proventos de aposentadoria para os servidores que se encaixam na regra de transição serão pagos na base de 60% da média aritmética dos salários percebidos pelo servidor, com acréscimo de 2% para cada ano de contribuição que exceder os 20 anos de participação no sistema. Os reajustes ocorrerão nos termos do aplicável ao Regime Geral da Previdência Social

É importante frisar que o atual projeto está com sua tramitação política paralisada, por força da decisão exarada no Mandado de Segurança nº. 2279999-23.2019.8.26.0000. Acreditamos, no entanto, que o PL em questão tende a ter sua votação retomada no início deste ano legislativo.

Assim é que, diante deste panorama sintético e que não aborda questões/situações funcionais individuais, salientamos que, prima facie, os associados que já tiverem condições objetivas para aposentação, devem considerar seriamente tal possibilidade, efetuando pedido formal neste sentido para a Administração Pública, visto que estamos diante de mudança paradigmática da lógica previdenciária paulista e, como já é uníssono no Excelso Pretório, não há direito adquirido a regime jurídico previdenciário que não estará mais em vigor. Neste sentido:

 

 

(…) Salientando a consolidada jurisprudência da Corte no sentido da inexistência de direito adquirido a regime jurídico previdenciário e da aplicação do princípio tempus regit actum nas relações previdenciárias, entendeu-se não haver, no caso, direito que pudesse se mostrar como adquirido antes de se cumprirem os requisitos imprescindíveis à aposentadoria, cujo regime constitucional poderia vir a ser modificado. Asseverou-se que apenas os servidores públicos que haviam preenchido os requisitos previstos na EC 20/98, antes do advento da EC 41/2003, adquiriram o direito de aposentar-se de acordo com as normas naquela previstas, conforme assegurado pelo art. 3º da EC 41/2003 (...). Esclareceu-se que só se adquire o direito quando o seu titular preenche todas as exigências previstas no ordenamento jurídico vigente, de modo a habilitá-lo ao seu exercício, (...) Assim, considerou-se não haver óbice ao constituinte reformador para alterar os critérios que ensejam o direito à aposentadoria por meio de nova elaboração constitucional ou de fazê-las aplicar aos que ainda não atenderam aos requisitos fixados pela norma constitucional. (...). Precedentes citados: ADI 3105/DF e ADI 3128/DF (DJU de 18.2.2005); RE 269407 AgR/RS (DJU de 2.8.2002); RE 258570/RS (DJU de19.4.2002); RE 382631 AgR/RS (DJU de 11.11.2005).

ADI 3104/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 26.9.2007. (ADI-3104)

 

Finalmente, esclarecemos que estamos à disposição no âmbito do Departamento Jurídico da AIPESP para, com base nas linhas acima, analisar a situação individual de cada associado interessado e sopesar todas as possibilidades, levando-se em consideração o melhor resultado da equação 'situação fática e jurídica atual do associado x andamento do projeto de lei x consolidação da nova normativa x regras de transição'.

Aproveitamos o ensejo para renovar nossos votos de elevada estima e distinta consideração.

 

Atenciosamente.

 

Capano, Passafaro Advogados Associados

 

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